• Livro: Memórias de um Sargento de Milícias

quinta-feira, 28 de abril de 2011

NOITE NA TAVERNA




JOHANN

Pour quoi? c'est que mon coeur au milieu des délices
D'un souvenir jaloux constamment oppressé
Froid au bonheur présent, va chercher ses supplices
Dans l'avenir et le passé.
Alex. Dumas.

— Agora a minha vez! Quero lançar também uma moeda em vossa urna: é o cobre azinhavrado do mendigo: pobre esmola por certo!
Era em Paris, num bilhar. Não sei se o fogo do jogo me arrebatar a, ou se o kirsch e o curaçao me queimaram demais as idéias... Jogava contra mim um moço: chamava-se Artur.
Era uma figure loura e mimosa como a de uma donzela. Rosa infantil lhe avermelhava as faces: mas era uma rosa de cor desfeita. Leve buço lhe sombreava o lábio, e pelo oval do rosto uma penugem doirada lhe assomava como a felpa que rebuça o pêssego.
Faltava um ponto a meu adversário para ganhar. A mim, faltavam-me não sei quantos: sei só que eram muitos e pois requeria-se um grande sangue frio, e muito esmero no jogar.
Soltei a bola. Nessa ocasião o bilhar estremeceu… O moço loiro, voluntariamente ou não, se encostara ao bilhar... A bola desviou-se, mudou de rumo: com o desvio dela perdi... A raiva levou-me de vencida. Adiantei-me para ele. A meu olhar ardente o mancebo sacudiu os cabelos loiros e sorriu como de escárnio.
Era demais! Caminhei para ele: ressoou uma bofetada. O moço convulso caminhou para mim com um punhal, mas nossos amigos nos sustiveram.
— Isso é briga de marujo. O duelo, eis a luta dos homens de brio.
O moço rasgou nos dentes uma luva e atirou-ma a cara. Era insulto por insulto; lodo por lodo: tinha de ser sangue por sangue.
Meia hora depois tomei-lhe a mão com sangue frio e disse-lhe no ouvido:
— Vossas armas, senhor?
— Saber-las-eis no lugar.
— Vossas testemunhas?
— A noite e minhas armas.
— A hora?
— Já.
— O lugar?
— Vireis comigo... Onde pararmos aí será o lugar...
— Bem, muito bem: estou pronto, vamos.
Dei-lhe o braço e saímos. Ao ver-nos tão frios a conversar creram uma satisfação. Um dos assistentes contudo entendeu-nos.
Chegou a nós e disse:
— Senhores, não há pois meio de conciliar-vos?
Nós sorrimos ambos.
— É uma criançada, tornou ele.
Nós não respondemos.
— Se precisardes de uma testemunha, estou pronto.
Nós nos curvamos ambos.
Ele entendeu-nos: viu que a vontade era firme: afastou-se.
Nós saímos.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Um hotel estava aberto. O moço levou-me para dentro.
— Moro aqui, entrai, disse-me.
Entramos.
— Senhor, disse ele, não há meio de paz entre nos: um bofetão e uma luva atirada as faces de um homem saco nódoas que só o sangue lava. E pois um duelo de morte.
— De morte, repeti como um eco.
— Pois bem: tenho no mundo só duas pessoas — minha mãe e... Esperei um pouco.
O moço pediu papel, pena e tinta. Escreveu: as linhas eram poucas. Acabando a carta deu-ma a ler.
— Vede, não é uma traição, disse.
— Artur, creio em vos: não quero ler esse papel.
Repeli o papel. Artur fechou a carta, selou o lacre com um anel que trazia no dedo. Ao ver o anel uma lágrima correu-lhe na face e caiu sobre a carta.
— Senhor, sois um homem de honra. Se eu morrer, tomai esse anel: no meu bolso achareis uma carta: entregareis tudo a... Depois dir-vos-ei a quem...
— Estais pronto? perguntei.
— Ainda não! antes de um de nos morrer e justo que brinde o moribundo ao último crepúsculo da vida. Não sejamos Abissínios: demais, o sol no cinábrio do poente ainda e belo.
O vinho do Reno correu em águas d’oiro nas taças de cristal verde. O moço ergueu-se.
— Senhor, permita que eu faça uma saúde convosco.
— A quem?
— É um mistério... é uma mulher, porque o nome daquela que se apertou uma vez nos lábios, a quem se ama, é um segredo. Não a fareis?
— Seja como quiserdes, disse eu.
Batemos os copos. O moço chegou a janela. Derramou algumas gotas de vinho do Reno à noite. Bebemos.
— Um de nós fez a sua última saúde, disse ele. Boa noite para um de nos... bom leito e sonos sossegados para o filho da terra!
Foi a uma secretária, abriu-a: tirou duas pistolas.
— Isto é mais breve, disse ele. Pela espada é mais longa a agonia. Uma delas esta carregada, a outra não. Tirá-las-emos à sorte. Atiraremos à queima-roupa.
— É um assassinato.
— Não dissemos que era um duelo de morte, que um de nos devia morrer?
— Tendes razão. Mas dizei-me: onde iremos?
— Vinde comigo. Na primeira esquina deserta dos arrabaldes. Qualquer canto de rua é bastante sombrio para dois homens dos quais um tem de matar o outro.
A meia-noite estávamos fora da cidade. Ele pôs as duas pistolas no chão.
— Escolhei, mas sem tocá-las.
Escolhi.
— Agora vamos, disse eu.
— Esperai, tenho um pressentimento frio e uma voz suspirosa me geme no peito. Quero rezar... é uma saudade por minha mãe.
Ajoelhou-se. À vista daquele moço de joelhos — talvez sobre um túmulo — lembrei-me que eu também tinha mãe e uma irmã... e que eu as esquecia. Quanto a amantes, meus amores eram como a sede dos cães das ruas, saciavam-se na água ou na lama. Eu só amara mulheres perdidas.
— É tempo, disse ele.
Caminhamos frente a frente. As pistolas se encostaram nos peitos. As espoletas estalaram, um tiro só estrondou, ele caiu quase morto...
— Tomai, murmurou o moribundo e acenava-me para o bolso.
Atirei-me a ele. Estava afogado em sangue. Estrebuchou três vezes e ficou frio... Tirei-lhe o anel da mão. Meti-lhe a mão no bolso como ele dissera. Achei dois bilhetes.
A noite era escura: não pude lê-los.
Voltei à cidade. À luz baça do primeiro lampião vi os dois bilhetes. O primeiro era a carta para sua mãe. O outro estava aberto, li:
— "A uma hora da noite na rua de... n.° 60, 1.° andar: acharás a porta aberta.
Tua G."
Não tinha outra assinatura.
Eu não soube o que pensar. Tive uma idéia: era uma infâmia.
Fui a entrevista. Era no escuro. Tinha no dedo o anel que trouxera do morto... Senti uma mãozinha acetinada tomar-me pela mão, subi. A porta fechou-se.
Foi uma noite deliciosa! A amante do loiro era virgem! Pobre Romeu! Pobre Julieta! Parece que essas duas crianças levavam a noite em beijos infantis e em sonhos puros!
(Johann encheu o copo: bebeu-o, mas estremeceu.)
Quando eu ia sair, topei um vulto à porta.
— Boa noite, cavalheiro... eu vos esperava há muito.
Essa voz pareceu-me conhecida. Porém eu tinha a cabeça desvairada...
Não respondi: o caso era singular. Continuei a descer, o vulto acompanhou-me. Quando chegamos a porta vi luzir a folha de uma faca. Fiz um movimento e a lamina resvalou-me no ombro. A luta fez-se terrível na escuridão. Eram dous homens que se não conheciam, que não pensavam talvez se terem visto um dia à luz, e que não haviam mais se ver porventura ambos vivos.
O punhal escapou-lhe das mãos, perdeu-se no escuro: subjuguei-o. Era um quadro infernal, um homem na escuridão abafando a boca do outro com a mão, sufocando-lhe a garganta com o joelho, e a outra mão a tatear na sombra procurando um ferro.
Nessa ocasião senti uma dor horrível: frio e dor me correram pela mão. O homem morrera sufocado, e na agonia me enterrara os dentes pela carne. Foi a custo que desprendi a mão sangüenta e descarnada da boca do cadáver. Ergui-me.
Ao sair tropecei num objeto sonoro. Abaixei-me para ver o que era. Era uma lanterna furta-fogo. Quis ver quem era o homem. Ergui a lâmpada...
O ultimo clarão dela banhou a cabeça do defunto... e apagou-se...
Eu não podia crer: era um sonho fantástico toda aquela noite. Arrastei o cadáver pelos ombros levei-o pela laje da calcada até ao lampião da rua, levantei-lhe os cabelos ensangüentados do rosto...
(Um espasmo de medo contraiu horrivelmente a face do narrador... tomou o copo, foi beber... os dentes lhe batiam como de frio... o copo estalou-lhe nos lábios).
Aquele homem — sabei-lo!?... era do sangue do meu sangue, era filho das entranhas de minha mãe como eu... era meu irmão! Uma idéia passou ante meus olhos como um anátema. Subi ansioso ao sobrado. Entrei. A moca desmaiara de susto ouvindo a luta. Tinha a face fria como o mármore. Os seios nus e virgens estavam parados e gélidos como os de uma estátua... A forma de neve eu a sentia meio nua entre os vestidos desfeitos, onde a infâmia asselara a nódoa de uma flor perdida.
Abri a janela, levei-a ate aí...
Na verdade que sou um maldito! Olá, Archibald, dai-me um outro copo, enchei-o de cognac, enchei-o até a borda! Vede!... sinto frio, muito frio... tremo de calafrios e o suor me corre nas faces! Quero o fogo dos espíritos! a ardência do cérebro ao vapor que tonteia... quero esquecer!
— Que tens, Johann? tiritas como um velho centenário!
— O que tenho? o que tenho? Não o vedes, pois? Era Minha irmã!


terça-feira, 26 de abril de 2011

GRAMÁTICA NORMATIVA - NORMA CULTA - VARIAÇÃO URBANA MAIS PRESTIGIADA - "NORMINHA" MINHA FILHA!!!...DICAS:


Quem liga o rádio ou a tevê espera ouvir uma "língua correta". Correta não significa rebuscada ou exibida. Significa apenas o elementar respeito a flexões, concordâncias, regências, pronúncias. Deslizes gramaticais não passam despercebidos. Ao contrário. Ecoam. "Não use":

a nível de – a forma é ao nível de (= à altura de): Recife fica ao nível do mar.
adéquo – adequar só se conjuga nas formas em que a sílaba tônica cai a partir do u: adequamos, adequais, adequei, adequarei. (Na dúvida, substitua-o por adaptar.)
aidético – pessoa com HIV.
colocar uma questão – fazer uma observação, fazer uma pergunta.
correr atrás do prejuízo – correr do prejuízo.
criar novas – só se cria o novo. Basta criar.
de formas que – locuções conjuntivas se usam no singular: de que forma que
de maneiras que – locuções conjuntivas se usam no singular: de maneira que.
de menor – use menor de idade ou diga a idade.
esteje – a forma é esteja.
estrear novo – só se estreia o novo. Basta estrear.
extorquir alguém – extorquir é arrancar: extorquir dinheiro de alguém, extorquir informações de alguém.
fazem dois anos – fazer, na contagem de tempo, é invariável. Só se conjuga na 3ª pessoa do singular: faz dois anos, fez cinco meses.
gratuito – gratuito se pronuncia como fortuito e circuito. O ui forma ditongo, sem acento.
houveram – no sentido de existir ou ocorrer, o verbo é impessoal. Só se conjuga na 3ª pessoa do singular: Houve distúrbios. Houve três acidentes.
intermedia – intermediar se conjuga como odiar: odeio (intermedeio), odeia (intermedeia), odiamos (intermediamos), odeiam (intermdeiam).
interviu – intervir deriva de vir: ele veio, ele interveio.
leproso – pessoa com hanseníase.
medio – mediar se conjuga como odiar: odeio (medeio), odeia (medeia), odiamos (mediamos), odeiam (medeiam).
meio-dia e meio – meio-dia e meia (hora)
melhor idade – diga a idade: 65 anos, 80 anos, 100 anos.
mongol – síndrome de Down.
panorama geral – todo panorama é geral. Basta panorama.
pequeno detalhe – todo detalhe é pequeno. Basta detalhe.
plano para o futuro – todo plano é para o futuro. Basta plano.
se eu caber – se eu couber.
se eu deter – se eu detiver.
se eu pôr – se eu puser.
se eu trazer – se eu trouxer.
se eu ver – se eu vir.
seje – a forma é seja.
subzídio – pronuncie o s como em subsolo.
vítima fatal – morto.
vou estar mandando & similares – vou mandar.


terça-feira, 12 de abril de 2011

PRIMEIRO DIA DE TRABALHO DO DEPUTADO FEDERAL "PEIXE"...OPS...ROMÁRIO.


...ÉÉÉÉÉ PAU NA PREGUIÇA!!!!!!

SANGUE "BATIZADO"...

Onde ou aonde?



Onde = lugar em que/ em que (lugar). Indica permanência, o lugar em que se está ou em que se passa algum fato. Complementa verbos que exprimem estado ou permanência e que normalmente pedem a preposição em: 

Onde estás? – Em casa.
Você sabe onde fica o Sudão? – Na África.
Onde moram os sem-terra?
Não entendo onde ele estava com a cabeça quando falou isso.
De onde você está falando?
Não sei onde me apresentar nem a quem me dirigir.  

Aonde = a que lugar. É a combinação da preposição a + onde. Indica movimento para algum lugar. Dá idéia de aproximação. É usado com os verbos ir, chegar, retornar e outros que pedem a preposição a. Exemplos:

Aonde você vai todo dia às 9 horas? – A Brusque.
Sabes aonde eles foram? – Ao cinema.
A mulher do século 21 sabe muito bem aonde quer chegar.
Não sei aonde ou a quem me dirijo.
Aonde nos levará tamanha discussão?
Faz três dias que saiu do Incor, aonde deverá retornar brevemente para uma revisão.
Estavam à deriva, sem saber aonde ir. Há lugares no universo aonde não se vai sozinho.

sábado, 2 de abril de 2011

PARA OS POETAS!

 
 
 
 
Redondilha maior

O verso mais popular do português? É a redondilha maior. Com sete sílabas, ela cabe na boca e gruda na memória. Todos a amam. As cantigas de roda abusam do modelo. A música popular também. Quem não canta A banda, de Chico Buarque, de cor e salteado? A poesia brasileira não fica atrás. A canção do exílio, de Gonçalves Dias, serve de exemplo. Ela frequenta salas de aula, saraus e a casa da gente com a familiaridade do sapato velho e da camiseta que aprendeu a forma do corpo.

Como saber se o verso é heptassílabo? O ouvido ajuda. Se ele gosta do ritmo, não precisa nem fazer o teste. Mas, se um descrente faz questão de ver para crer, basta contar o número de sílabas. É fácil. Mas ele tem de observar uma manha. A contagem para na sílaba tônica. Exercite:

Terezinha de Jesus / Deu a queda foi ao chão / Acudiram três cavaleiros / Todos três chapéu na mão.

Minha terra tem palmeiras / Onde canta o sabiá / As aves que aqui gorjeiam / Não gorjeiam como lá.

Estava à toa na vida / O meu amor me chamou / Pra ver a banda passar / Cantando coisas de amor.

PÉ DE CACHIMBO?




HOJE É DOMINGO PÉ DE CACHIMBO... e eu ficava imaginando como seria um pé de cachimbo. Ops! O correto é: HOJE É DOMINGO PEDE CACHIMBO. Explica-se: domingo é um dia especial para relaxar e fumar um cachimbo em vez do tradicional cigarro (para aqueles que fumam, naturalmente).